quinta-feira, 18 de julho de 2013

Concretude do amor.

 Concretude do amor.

Uma das coisas que mais intriga o ser humano é o amor.
Falamos em amor. Por vezes, defendemos o amor e sua riqueza; por vezes, questionamos sua existência, sua eficácia. Imaginando, damos formas equívocas ao amor. Apontamos, também, contrapostos e antagonismos. Porém, sua vivência encarnada - raramente encontramos.



Meu ser vivencia uma forte convicção: eu conheço o amor. 

Vivi em um lar cristão, onde esse termo era constantemente pronunciado; em minha casa, o amor tinha um nome: Deus -, Deus é amor. Porém, por conta de minha falta de profundidade, de espiritualidade, essa premissa soava, por demais, abstrata, ou, distante de minha limitada percepção.

Cresci em um lar onde ser filho significava: ser alvo de atenção e preocupação de meus pais. Cada um de sua maneira, meus pais investiam na vida de seus filhos, procurando fazê-los alcançar o caminho de o bom viver, ou, das Bem Aventuranças. Meu pai, tentado fazer-nos acertar a caminhada, usava as palavras, suaves ou duras, suas, do povo, ou bíblicas - ou, quando elas não se mostravam eficazes, palmadas, puxões de orelha, chineladas, ou, como último recurso, a temida cintada. Minha mãe, apesar de não se valer dos recursos de meu pai não os invalidava, às vezes pedia mais moderação. Seu recurso era: complementar a rigidez da correção, ou seja, os recursos de meu pai, que intentava nos levar a um bom termo -, com gestos de afago e acolhimento: um beijo muito carinhoso, fartura de agrados nos momentos de enfermidade, elogios que alcançavam seus filhos, tanto em aspectos físicos como, morais. 

Em meio a esse ambiente, onde diferentes gestos tencionavam nos fazer felizes -, me sentia feliz. Via que meu pai, rígido na tentativa de nos levar ao caminho do bom viver, tentava amenizar sua postura com esporádicas brincadeiras, provando aos seus que aquela rigidez, não refletia os sentimentos que nutria por seus filhos, sentimento que implicavam cuidado, carinho e responsabilidade. Outrossim, presenciamos, a intensa doação de minha mãe em favor de seu esposo e de seus filhos. Testemunhamos também, o distanciamento físico de nossos pais: eles foram morar em Alagoas, terra de suas origens, e de nossa também. Toda vez que íamos visita-los, ou quando eles vinham nos ver, a alegria era completa: falas, risos, lembranças, afetos de ambas as partes – que não permitia que nenhum membro da família ficasse de fora, deixando de se nutrir da alegria da presença. 

Enxergar o valor de meus pais, em nossas vidas, fez de minha família, uma família saudosista. Temos o nosso passado como um tributo – um presente de nossos pais. Por conta da riqueza percebida, não relegamos o passado familiar aos porões da memória, a cada encontro familiar, nós, filhos de Laerço dos Santos e Eliane Castanha de Oliveira Santos, nos alegramos com nossa história. 

Eu falava sobe amor... que meu ser vivencia uma forte convicção: eu conheço o amor. 

Meu ser vivencia essa forte convicção porque tenho recebido, nesses últimos dias, o intenso carinho de minha mãe. Nesses dias de Julho de 2013 - conto com a riqueza da presença de minha mãe: tão maravilhosa e tão singela, que nos faz lamentar sua ausência, mesmo antes de sua partida. Pela primeira vez, veio nos ver sem a presença de seu tão amado “Véio” – como carinhosamente chamava seu dedicado e amoroso esposo, nosso, também dedicado e amado, pai.

A presença de minha mãe, seu histórico de vida -, de dedicação, renúncia, de afetos em prol de seu esposo e de seus filhos, me fez relembrar a intensa sensação de ser “querido” por alguém. Minha mãe, que sempre acreditou que “Deus é amor”, com sua vida, fez, e ainda me faz perceber a existência desse atributo, que segundo as Escrituras – vem de Deus, pois toda boa dádiva procede do pai das luzes. Se sua fé no amor de Deus, produziu nela a vivência do amor, possibilitou aos filhos, o entendimento do amor de Deus. 

O apóstolo João, o discípulo amado, afirma: "Filhinhos, não amemos de palavra, nem de língua, mas de fato e de verdade." (1 Jo 3:18)
Apesar de saber que há uma série de manifestações, equivocadamente, apresentadas como gestos amorosos, como manifestações de amor, minha mãe, com tudo o que com sua família construiu, com toda sua incondicional doação em prol dos “seus”, me faz ter certeza que minha sensação de se sentir querido, de fato, revelava, a ainda revela que sou amado, e, portanto conheço o amor, pois amor nela se fez carne, como exorta o apóstolo João, ela ama e sempre amou sua família de fato e de verdade. 

Hoje, uma das coisas que menos me intriga é o amor, mesmo sendo ele, uma das coisas que mais intriga o ser humano, pois, para mim, amor é assunto resolvido. Continuo não o compreendo, pois não podemos alcançar sua totalidade, porém, o sinto, com muita intensidade. 

Com muito amor, agradeço a minha mãe, que, com sua presença, sempre renova em mim boas recordações, atualizando a minha reflexão sobre o amor, além de revitalizar a sensação de amar e ser amado.



Lailson Castanha

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Foto: minha mãe Eliane Castanha, e minha irmã Liliane Castanha

sexta-feira, 12 de julho de 2013

O VALOR DA VIDA AUTÊNTICA


O VALOR DA VIDA AUTÊNTICA

Tenho pensado muito na importância da vida simples, na vida que intimamente assumimos como realmente pessoal, ou, não artificial.

Nós, ocidentais hodiernos, temos a tendência de construir em nossa existência dois modelos de vida: a vida simples, despojada de ostentações e a vida ostensível – modelo que usamos para nos apresentar às pessoas que não fazem parte de nosso círculo íntimo, a fim de nutrir apelos e exigências que nos são estranhas, porém, que nos dão a sensação de familiaridade e de naturalidade com os modelos sociais. O problema da vida ostensível, que usamos para nos apresentar como pessoas sintonizadas com os modelos dominantes, é que, em muitos casos, termina por implicar uma total rejeição a vida simples; com isso, nossa vida postiça termina por sufocar nossa naturalidade, e assim, sem perceber, acabamos por rejeitar nossa simplicidade.

Aspiro assumir-me integralmente, como pessoa, e não como protótipo de um determinado estilo de vida -, que influencia boa parte da camada social, por força de seu apelo de inclusão. Sei que a pressão social tem força para constranger aqueles que não cedem a seus apelos, por mais loucos que sejam -, fazendo parecerem loucos, aqueles que não cedem a suas loucuras. Porém, e apesar da pressão e dos riscos, quero assumir-me -, mesmo que o preço a pagar seja alto, pois, mais alto preço é negar-se a si mesmo: o que somos; nossa origem e naturalidade. Não fui criado para abandonar, resignadamente, meu caráter, meus gostos (por mais pueris que sejam), valores - absorvidos desde a minha infância, personalidade -, em troca de valores, gostos e posturas postiças, que tem sua validade atrelada à aceitação e status social. Fui criado com um forte imperativo – “se valorize!” – assim me ensinou meu pai -, “nunca se diminua, nunca imite os outros!”.

Oxalá, compreendamos o valor da diversidade e a riqueza de um convívio em que possamos aprender e comungar, com autenticidade, na diversidade; em que haja, com naturalidade, a aceitação ou rejeição de ideias e costumes sejam eles, de pessoas, culturas ou classes - como uma efetiva opção, em detrimento a pressão de um estabelecido modelo social ou cultural, mesmo que sua oferta seja a desejada inclusão.

Lailson Castanha

terça-feira, 25 de junho de 2013

NESTA CALÇADA

NESTA CALÇADA
Sidney Wanderley

Piso
nesta calçada
em que outrora tantos outros trafegaram
os que ainda respiram, os que já se foram
os que neste momento agonizam e se encolhem
no estreito espaço que separa a vida e a morte

piso
sobre as marcas indeléveis e invisíveis
das passadas de humanos que ignoro
e no entanto, como eu, aqui passaram;
das passadas de um menino que já fui
há quinze anos correndo sobre esta mesma calçada:
os passos lépidos, os pés diminutos, sorriso nas faces
sem marcas de dissabores, madureza, sofrimento
e um sol morno em meus olhos , em meu dorso

piso
nesta calçada
e com a sola gasta dos sapatos
nela escrevo uma palavra: VIDA,
como poderia ter escrito SANGUE
FÊMEA BLUSA
ÂMBAR
ou até meso KXPTY,
fosse eu abstrato e concretista,
mas a VIDA é o que, por ora, bate fundo nas retinas
como botas militares marchando por sobre o asfalto

por sobre a calçada
piso
piso e me arguo
de nós dois qual aquele que mudou:
se o poeta? Se a calçada?
E uma brisa discreta eriça meus pelos
e refresca meu corpo
sussurra-me como disse Heráclito 
que não se adentra, que não se caminha duas vezes
o mesmo rio, pela mesma calçada

piso
como se fosse o último sobrevivente de minha espécie
passeando sobre a calçada única do Universo
e entanto sei-me igual a tantos outros:
duas pernas, muitos passos, um caminho
e sei — talvez bem mais que os outros —
ser esta calçada em que minha sombra se projeta
nada mais que discreta notícia, infindo rol
de incontáveis viventes que por aqui passaram

piso
por isto piso assim
nesta calçada:
tão senhor dela
e de mim.


Sidney Wanderley.
Poeta alagoano; nasceu no município de Viçosa em outubro de 1951. Revisor. Professor de Biologia.
Publicou vários livros, entre eles:
Poemas post-húmus (1991); Nesta calçada (1995);Quisera ter a beleza que (1997); De Riacho do Meio a Viçosa de Alagoas (1998); Na Pele do Lago (1999); Desde Sempre (2000); Três Vozes Nordestinas (2001); Entropia (2004); Chuva e não (2009); Dias de sim (2012).

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WANDERLEY, Sidney. Nesta calçada. São Paulo: Iluminuras, 1995.
Imagem: Livro Nesta Calçada, de Sidney Wanderley

segunda-feira, 10 de junho de 2013

LIBERDADE

LIBERDADE

Algemas prendem meus pulsos frágeis...
IDEALISTA, ROMANTICA, SONHADORA.
Massas esmagadoras, contraditórias,
Que nem mesmo sabem no que acreditam,
Tiram-me o direito de revelar minha face.

Direito...
Apenas direito de ser eu mesma,
Não apenas num instante,
Contrariando os perfis impecáveis, a mim imposta,
Acreditando e revelando meus genuínos pensamentos.

Meu avesso, revela intocável,
Sem o toque dos manipuladores.
Esquadrinho meus pensamentos,
Descubro pureza na alma,
Sou eu mesma, sem as manobras dos seres.

Idealizo... Sublime concretizo,
O real valor do genuíno.
Sem os aplausos das massas,
Conformismos dos fracos,
Seguirei meu caminho, resoluto,
Sou um ser pensante, nada me detém.

Sonho... Idealizo um mundo melhor,
Que não sufoque os anseios, a essência.
Amo com a mesma forca que vivo,
Discriminada sou, por não ser como a maioria,
Sou autêntica, inconformada com a mediocridade,
Quero minha liberdade, preciso da minha alforria.

Liliane Castanha
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Imagem: A Condição Humana, de René Magritte

terça-feira, 23 de abril de 2013

Refletindo sobre a educação efetiva e a caotização na educação.

Refletindo sobre a diferença entre o matagal e o jardim, sobre a educação efetiva e a caotização na educação.

Qual é a diferença entre o matagal e o jardim? A princípio a resposta nos parece óbvia, porém, ao tentar externá-la, percebemos que se faz necessário um esforço reflexivo. Tentando responder, chegamos a uma possível conclusão aceitável, a saber: o matagal cresce impulsionado pela força da natureza, sem necessidade de um esforço ou arranjo humano. Tudo o que ele apresenta se manifesta como ato independente, natural. Já o jardim, é uma construção humana, e, como tal, necessita do cuidado de um arranjador, de um jardineiro, profissional ou não, a fim de que a ordem por ele estabelecida se mantenha. Sem a intervenção do jardineiro, ou o arranjador, o jardim vira matagal.

Arrazoando sobre a desordem estabelecida em nossa sociedade e suas instituições, e na possibilidade da harmonização podemos nos valer das disparidades - ordem do jardim e caos do matagal -, como metáfora.

A sociedade e suas instituições se assemelham ao jardim. O caos se estabelece quando as instituições sociais são entregues ao acaso ou deixadas nas mãos de um gestor, de um jardineiro sem dedicação.

Plauto e depois Hobbes afirmaram que o homem é o lobo do homem. A semelhança do selvagem animal da família dos canídeos, o homem vê no outro a bandeira da concorrência, e, por isso, como que por instinto, se vale da agressão, como uma possibilidade de prevalecer diante do concorrente. Diante de situações como essa, soa-nos sensata a afirmação de Emmanuel Mounier: “o mundo dos outros não é um jardim de delícias”. Por sua vez, Hobbes entendia que a solução dos homens para acabar com o caos, por ele chamado de guerra de todos contra todos, foi a instauração do poder do Soberano para reger, com leis, as diferenças instaladas no ajuntamento humano. A partir dessa solução, surge o Estado, elevado pelos homens que abriram mão de sua liberdade individual, a fim de que suas diferenças fossem harmonizadas pela interferência do Soberano.

Se a ideia de Hobbes está correta, e também a de Mounier faz-se necessário a criteriosa intervenção humana, para que instituições humanas, não se tornem caóticas. Se a condição humana facilmente leva ou convida indivíduos a assumirem práticas caóticas e agressivas contra homens e instituições humanas, não podemos deixar homens e instituições a mercê do acaso. Agindo assim, estaríamos nos assemelhando ao jardineiro que abandona o jardim por ele idealizado, permitindo, com o seu gesto, que sua criação seja obnubilada pela força natural dos matos - que se fazem matagal. Sendo passivos, e sendo válida a teoria de Hobbes, permitiríamos que homens voltassem ao estado caótico de outrora, e que as instituições se desestruturassem.

Todo esse volteio ponderativo foi dado com o fim de nos levar a reflexão sobre o estado da educação no Brasil e a cultura da caotização nela instalada. Se pensarmos a educação como um estimado jardim, vemos nela, um motivo de zelo e cuidado. Um motivo para constantes e diretas intervenções. Como o exemplo do jardim, que deve contar com a atitude do jardineiro de arrancar o mato que insiste em crescer em seu âmbito, a educação, entre outras coisas, deve contar com intervenções contra práticas inadequadas, por exemplo, violência, de todo e qualquer tipo, não comprometimento e ausência de seriedade, ou seja, toda prática que torne caótica a ambiência educacional. Não é possível que alcancemos um estado de civilidade, ou que nos mantenhamos nele, ou o mais próximo dele, se não lutarmos para bloquear os excessos da individualidade egocêntrica, alheia aos interesses comunitários, que ferem a harmonia de um saudável estado civilizatório. É necessário intervir.

Como um bom jardineiro que deve saber qual é a ferramenta adequada para cada intervenção no cuidado do jardim, impedindo que plantas estranhas, invasoras sufoquem as belas plantações flóreas, nós, gestores e professores, e demais participantes da prática educadora, devemos procurar saber qual é o melhor método para agir diante das circunstâncias em que a educação está instalada, o que fazer, como fazer, com quem contar e como contar, enfim, independente de quais devam ser os meios e métodos a serem adotados, devemos agir com rigor, para não testemunharmos a transformação do ambiente educacional, em um caótico espaço de deseducação -, de embrutecimento coletivo e de caotização institucional.

Lailson Castanha.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Sentido da vida.


Sentido da vida.

Às vezes, diante da sensação de vazio existencial, perguntamos sobre o sentido da vida. O curioso é que, em meio ao nosso círculo familiar, em cada amizade, nova ou já constituída, em cada desafio, ou seja, em nossas circunstâncias, o sentido de nossa vida se mostra como uma pessoal possibilidade de construção, de transformação, ou, como um acontecimento que conta conosco, com nossa participação, com nossa doação e nós não percebemos.

Tantas pessoas em busca de acolhimento, tantas questões esperando uma solução - que talvez possamos resolver; tanta gente ao nosso lado clamando por amor, e, continuamos buscando compreender o sentido da vida. Diante desses questionamentos, entendo que a frase de Jesus “Vós sois o sal da terra; e se o sal for insípido, com que se há de salgar?” apresenta-se como muito significativa.

Não estamos envolvidos nas situações como respostas absolutas. Porém, o que se espera daqueles que estão envolvidos em suas específicas situações, ou que se deparam com questões, é que procurem compreendê-las a fim de resolvê-las, caso a questão não seja uma tarefa sua, que auxilie à alguém no cumprimento dessa tarefa. Esse é um desafio a nós imposto, e quem sabe, o sentido de nossa vida.

Lailson Castanha
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Gravura: de Salvador Dali (1931) -Remorso, também conhecida como Esfinge encravada na areia.