Refletindo sobre a diferença entre o matagal e o jardim, sobre a educação efetiva e a caotização na educação.
Qual é a diferença entre o matagal e o jardim? A princípio a resposta nos parece óbvia, porém, ao tentar externá-la, percebemos que se faz necessário um esforço reflexivo. Tentando responder, chegamos a uma possível conclusão aceitável, a saber: o matagal cresce impulsionado pela força da natureza, sem necessidade de um esforço ou arranjo humano. Tudo o que ele apresenta se manifesta como ato independente, natural. Já o jardim, é uma construção humana, e, como tal, necessita do cuidado de um arranjador, de um jardineiro, profissional ou não, a fim de que a ordem por ele estabelecida se mantenha. Sem a intervenção do jardineiro, ou o arranjador, o jardim vira matagal.
Arrazoando sobre a desordem estabelecida em nossa sociedade e suas instituições, e na possibilidade da harmonização podemos nos valer das disparidades - ordem do jardim e caos do matagal -, como metáfora.
A sociedade e suas instituições se assemelham ao jardim. O caos se estabelece quando as instituições sociais são entregues ao acaso ou deixadas nas mãos de um gestor, de um jardineiro sem dedicação.
Plauto e depois Hobbes afirmaram que o homem é o lobo do homem. A semelhança do selvagem animal da família dos canídeos, o homem vê no outro a bandeira da concorrência, e, por isso, como que por instinto, se vale da agressão, como uma possibilidade de prevalecer diante do concorrente. Diante de situações como essa, soa-nos sensata a afirmação de Emmanuel Mounier: “o mundo dos outros não é um jardim de delícias”. Por sua vez, Hobbes entendia que a solução dos homens para acabar com o caos, por ele chamado de guerra de todos contra todos, foi a instauração do poder do Soberano para reger, com leis, as diferenças instaladas no ajuntamento humano. A partir dessa solução, surge o Estado, elevado pelos homens que abriram mão de sua liberdade individual, a fim de que suas diferenças fossem harmonizadas pela interferência do Soberano.
Se a ideia de Hobbes está correta, e também a de Mounier faz-se necessário a criteriosa intervenção humana, para que instituições humanas, não se tornem caóticas. Se a condição humana facilmente leva ou convida indivíduos a assumirem práticas caóticas e agressivas contra homens e instituições humanas, não podemos deixar homens e instituições a mercê do acaso. Agindo assim, estaríamos nos assemelhando ao jardineiro que abandona o jardim por ele idealizado, permitindo, com o seu gesto, que sua criação seja obnubilada pela força natural dos matos - que se fazem matagal. Sendo passivos, e sendo válida a teoria de Hobbes, permitiríamos que homens voltassem ao estado caótico de outrora, e que as instituições se desestruturassem.
Todo esse volteio ponderativo foi dado com o fim de nos levar a reflexão sobre o estado da educação no Brasil e a cultura da caotização nela instalada. Se pensarmos a educação como um estimado jardim, vemos nela, um motivo de zelo e cuidado. Um motivo para constantes e diretas intervenções. Como o exemplo do jardim, que deve contar com a atitude do jardineiro de arrancar o mato que insiste em crescer em seu âmbito, a educação, entre outras coisas, deve contar com intervenções contra práticas inadequadas, por exemplo, violência, de todo e qualquer tipo, não comprometimento e ausência de seriedade, ou seja, toda prática que torne caótica a ambiência educacional. Não é possível que alcancemos um estado de civilidade, ou que nos mantenhamos nele, ou o mais próximo dele, se não lutarmos para bloquear os excessos da individualidade egocêntrica, alheia aos interesses comunitários, que ferem a harmonia de um saudável estado civilizatório. É necessário intervir.
Como um bom jardineiro que deve saber qual é a ferramenta adequada para cada intervenção no cuidado do jardim, impedindo que plantas estranhas, invasoras sufoquem as belas plantações flóreas, nós, gestores e professores, e demais participantes da prática educadora, devemos procurar saber qual é o melhor método para agir diante das circunstâncias em que a educação está instalada, o que fazer, como fazer, com quem contar e como contar, enfim, independente de quais devam ser os meios e métodos a serem adotados, devemos agir com rigor, para não testemunharmos a transformação do ambiente educacional, em um caótico espaço de deseducação -, de embrutecimento coletivo e de caotização institucional.
Lailson Castanha.