À
PROCURA DE FILHOS
Um grande vazio
invade o coração de uma mãe que se encontra longe de seus filhos. Os mesmos
filhos pelos quais ela se doou, sofreu e
procurou ainda que errando ou acertando oferecer-lhes o melhor que podia.
Aqueles mesmos filhos para os quais ela trazia o pãozinho e a “mistura”
oferecidos pela fábrica onde trabalhava, para amenizar a fome ou a vontade de comer
algo que não era comum em casa. Os filhos cresceram e o que ela pode oferecer nesse processo foi um pouco de quase nada;
nada de cultura, nada de preparo para a vida, nada de orientação, mas muito,
muito exemplo de mulher de trabalho, de lida, mulher que passava o fim semana
lavando roupa no tanque puxando água do poço e cantando de com o rádio alto.
Estendia no varal inúmeras peças de
roupas muito brancas, aliás, azuladas pelo anil e, em poucos minutos.... lá se ia o varal ao chão e
começava-se tudo outra vez. Essa mesma
mulher de Capão Redondo se preocupava com a filha mais velha que mesmo casada e
morando no bairro do Brooklin (uau!), contratava uma empregada para faxinar a
casa da filha que estava grávida e com hepatite . Quantas vezes saía atrás do
filho mais novo que não se sabia por onde andava. Pagava todas as contas que
ele fazia quando ele decidia sair pra
vender biju ou sorvete que, na hora da fome
comia os produtos da caixa. Ainda alugou casa para que ele pudesse morar com a
garota que estava grávida dele e pagava o aluguel fielmente. Com a segunda
filha muitas preocupações com relação a saúde dela e mais tarde sofria pela
distância. Quanto a mim, lembro-me bem do quanto eu era respondona e birrenta e
como pude contar com a ajuda da mamãe em toda a minha em diversas ocasiões,
especialmente com relação aos meus
filhos.
Ela envelheceu,
sempre se doando, do jeito que podia , foi então que descobri que AMOR não é
sentimento, pois amar através de
palavras é muito fácil. A palavra amor virou clichê de inúmeras situações,
inclusive as repudiáveis. Os mais banais ou mais vis dos desejos é muitas vezes
expresso pela palavra amor. Então, amor sem atitude não é amor, pois AMOR é
ATITUDE, amar é abrir mão, amar é se privar de algo em prol de outrem, amar é
doar-se. Aprendi com a mamãe e tenho o
privilégio de compartilhar com meu marido , meus filhos, netas..... Diante de
tudo isso, me sinto no dever de no
mínimo amá-la.
Nossa mãezinha
está desistindo de viver. Ela tem um vazio para ser preenchido por filhos que a
amem, filhos que façam por ela, filhos que resgatem-na pois ela foi esquecida,
omitida e desprezada pelos mesmos filhos por quem ela se doou. Filhos que
encontram-se em sua zona de conforto e que através de um telefonema sentem-se
com a consciência tranqüila como que tarefa
cumprida.
Procura-se
uma filha que faz uma longa viagem e se conforma em passar uma tarde com a
mãe e tem o descaramento de dizer “ ainda bem que nós temos a mamãe, ela está
muito viva dentro do meu coração” . É, realmente bem lá dentro, tão lá dentro
que nem dá pra alcançar.
Procura-se um
filho que se digne a pegar um ônibus na porta de sua casa e vir ver a mãe, esse
mesmo filho que ela visitou no início das
férias e por quem ela perguntou durante
3 semanas e ainda que ela estivesse
na cidade vizinha ele não se dignou a visitá-la.
Procura-se filhos
que honrem seus pais conforme o mandamento, a quem O Criador promete bênçãos sem medida.
Procuram-se
filhos que se lembrem que também têm filhos e que a vida se encarrega de
cobrar.
Procura-se os
filhos da mamãe, antes que ela lhes
esqueça a fisionomia.
Procura-se filhos que amem a mamãe, antes que ela se vá e
seja muito tarde para chorar.
Ao ver o
declínio rápido da mamãe nos últimos dias minhas lágrimas rolam mesmo sem eu
querer. Não sei em que caso ela se
encaixa; aquele que a pessoa se entrega
e logo deixa de viver ou aquele em que a pessoa desiste de viver e fica por anos
em cima de uma cama. Mas de uma coisa eu sei, ela está desistindo de viver.
Procura-se
filhos que ainda que se sintam impotentes diante de uma cruel realidade, não se
conformem em desistir da única mãe que têm.
Edna Albuquerque
(filha).
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Imagem: Mãe de Whistler (1871), de James McNeill Whistler
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Imagem: Mãe de Whistler (1871), de James McNeill Whistler
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